Uma corrente jurídica alinhada às necessidades práticas
dos agentes econômicos. Originária na Finlândia no início do século XXI, suas
ideias espraiaram-se para Europa e Estados Unidos, o que resultou em uma série
de livros e artigos jurídicos publicados, bem como na formação da Escola Nórdica
de Direito Proativo
O crescente desenvolvimento econômico acrescido ao fenômeno
da globalização característico do final do século XX e início do século XXI
modificou substancialmente o modo como se produzem e comercializam bens e
serviços, elevando sobremaneira a complexidade das operações econômicas. Uma
vez que tais operações são instrumentalizadas pelos contratos, os quais
constituem suas verdadeiras “vestes jurídico-formais”, na já clássica concepção
do jurista italiano Enzo Roppo1, também estes contratos ganham em complexidade,
assumindo diferentes cláusulas, formas e funções.
No mesmo sentido, o desenvolvimento tecnológico, a
desverticalização das cadeias produtivas e a contínua busca por inovação como
fator determinante de vantagem competitiva alterou o modo como empresas se
organizam, aumentando a importância de relacionamentos mais interdependentes e
colaborativos, garantidos por contratos aptos a se sustentarem no tempo
enquanto geram valor para ambas as partes.
Entretanto, nenhum contrato é imune à crises e adversidades,
circunstância que, no momento atual, fatalmente se evidencia pelo profundo
impacto da pandemia do novo coronavírus na estabilidade de inúmeras relações
econômicas e contratuais ao redor do globo.
Em cenários de crise, a prestação contratual pode, por um
lado, tornar-se excessivamente onerosa a uma das partes, o que reclama medidas
de recomposição do equilíbrio econômico-financeiro do contrato com vistas à
preservação do negócio jurídico. Por outro lado, o cumprimento definitivo da
prestação pode ser dificultado de tal forma que se torne impossível de ser
realizado, circunstância que demonstra a necessidade de se encontrar uma
solução jurídica adequada às circunstâncias específicas de cada caso.
Embora o Direito Contratual ofereça remédios clássicos e
cristalizados em diferentes disposições do Código Civil para lidar com desequilíbrios no
percurso da execução contratual, a exemplo dos artigos 478, 479, e 480 do
referido diploma legal, a “aplicação da medicina” demandará, em larga medida,
do dispêndio de tempo, dinheiro e energia das partes contratantes,
presumidamente debilitadas pelas consequências econômicas negativas da crise no
desempenho de suas atividades.
A sujeição do acordo ao crivo do Poder Judiciário ou mesmo
dos tribunais arbitrais acarreta, com efeito, gastos e intervenções externas na
esfera da autonomia contratual que certamente poderiam ser evitados ou
mitigados caso adotada uma perspectiva mais proativa na gestão do processo de
contratação.
O Direito Proativo surge, nesse contexto, como uma corrente
jurídica alinhada às necessidades práticas dos agentes econômicos. Originária
na Finlândia no início do século XXI, suas ideias espraiaram-se para Europa e
Estados Unidos, o que resultou em uma série de livros e artigos jurídicos
publicados, bem como na formação da Escola Nórdica de Direito Proativo,
composta por pesquisadores da Dinamarca, Finlândia, Islândia, Noruega e Suécia,
e do departamento de estudos denominado Proactive ThinkTank, liderado por uma
equipe principal da Dinamarca, Finlândia, França, Holanda e Reino Unido2.
Para a perspectiva proativa, a visão tradicional do contrato
é demasiadamente estreita, porquanto, essencialmente jurídica e reativa, foca
mais em seu papel na resolução de litígios futuros do que na promoção de
comportamentos que auxiliem no sucesso das operações que instrumentalizam.
Consequentemente, tal visão acaba, não raro, por minar a confiança e prejudicar
a criação e manutenção de relacionamentos reciprocamente vantajosos.
Sabe-se, porém, que todo contrato é incompleto e que a
tentativa de previsão do máximo de contingências futuras capazes de serem
adiantadas quando da celebração do acordo pode, além de desgastar a relação
entre as partes, gerar aumento indesejado dos custos de transação.
Por outro lado, como ensina Fernando Araújo, comportamentos
desonestos são, em geral, espontaneamente evitados pelo receio de retaliação,
de ostracismo, ou da perda do investimento no capital de reputação que, por sua
vez, pode ser considerado como um “afloramento do conceito de capital social”3.
Nesse sentido, para o autor, é evidente a importância que o ambiente de
confiança e cooperação veio a adquirir na teoria, havendo quem sustente
constituir-se um fator concorrencial estratégico, bastando pensar no papel
fundamental que desempenha em fenômenos de rede, por exemplo, ou na própria
caracterização relacional4.
O autor ainda acentua que o ambiente de confiança constitui
espécie de aglutinador social, o qual permite pessoas interagirem a baixos
custos de transação, promovendo o bem-estar social na medida em que viabiliza
mais investimentos produtivos em condições de complementariedade e
interdependência; sendo inegável, portanto, a relevância do papel disciplinador
exercido pelas normas sociais, limando comportamentos desonestos e promovendo a
confiança e a cooperação estimadas pelos comerciantes.5
Por essas razões, o Direito Proativo, ao enxergar os
contratos pelas lentes de gestores e empresários, destaca a importância do
estímulo à colaboração entre as partes dentro do contrato. Isso porque,
sobretudo em relações duradouras que demandam estabilidade, é o próprio
contrato que deve se preocupar com o seu futuro, dotando-se de elementos que
permitam maior flexibilidade ao acolher conteúdos aptos a ajustar a relação
frente às circunstâncias concretas6.
As partes podem incluir, a título de exemplo, cláusula que
estabeleça a presença de um Comitê de Resolução de Disputas (Dispute Resolution
Board) para acompanhar, desde o princípio, o desenvolvimento do contrato cuja
execução se estenda no tempo, apreciando as eventuais controvérsias técnicas
surgidas e emitindo decisões com força vinculativa, ou não, para os contratantes,
a depender do estipulado no acordo. A importância de tais comitês é marcante,
resolvendo conflitos de maneira célere e menos custosa.
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Fonte: Migalhas