Notários e registradores participaram de tarde de debates
Promovido pelo Colégio Notarial do Brasil – Seção Rio Grande do Sul (CNB/RS) e patrocinado pela Cooperativa de Economia e Crédito Mútuo dos Notários e Registradores (Coopnore), o curso ‘Provimento Nº 88/2019 do Conselho Nacional de Justiça: procedimentos extrajudiciais no combate à lavagem de dinheiro’ contou com a presença de 225 notários e registradores em busca de orientações a respeito da normativa, que passa a vigorar a partir de 3 de fevereiro. O evento aconteceu durante a tarde desta terça-feira (21), no Centro de Eventos do Hotel Continental, em Porto Alegre.
O presidente do CNB/RS, Ney Paulo
Silveira de Azambuja, fez a abertura do evento destacando o comparecimento do
presidente do Comitê de Advocacia Digital da Ordem dos Advogados do Brasil –
Seccional Rio Grande do Sul (OAB/RS), Juarez Freitas. “Eu agradeço muito a
presença de todos vocês aqui hoje. Desejo que todos tenhamos uma tarde muito
enriquecedora”, disse Azambuja.
Antes do início da palestra, o gerente da Coopnore no Rio Grande do Sul, Pedro Aguiar, apresentou rapidamente a cooperativa, suas taxas, planos de previdência e áreas de crédito. “Usem a Coopnore porque ela é de vocês, para vocês”, afirmou.
A assessora jurídica do CNB/RS, Karin Rick Rosa, agradeceu a presença da palestrante, Débora Poeta Weyh, e apresentou o currículo da professora universitária, advogada e mestre em Ciências Criminais. “Eu sei que vocês estão preocupados com o Provimento que entra em vigor no dia 3 de fevereiro, mas eu quero dizer que eu tenho certeza que teremos uma tarde muito produtiva porque, na minha opinião, não existe ninguém melhor para falar sobre esse assunto”, destacou Rosa.
Weyh iniciou sua fala explicando
que a obrigação da atuação no combate à lavagem de dinheiro é um desafio
existente desde 1998 para alguns entes públicos, que agora chegou até a classe
extrajudicial. Originada em um compromisso de direito internacional, a Lei Nº
9.613/1998 dispôs, entre outras providências, sobre os crimes de lavagem de
dinheiro e/ou ocultação de bens, direitos e valores; sobre a prevenção da
utilização do sistema financeiro para fins ilícitos e criou o Conselho de
Atividades Financeiras (COAF).
“Uma coisa que vocês precisam
entender é que o combate à lavagem de dinheiro é um mecanismo cobrado
internacionalmente, porque muitas vezes essas ações ultrapassam fronteiras”,
contextualizou. De acordo com a palestrante, para que o crime de lavagem de
dinheiro seja concretizado, é necessário que haja um crime antecedente, que dê
origem ao “dinheiro sujo”. O crime é composto, geralmente, por três etapas: a
colocação, quando o criminoso recebe o valor e repassa; a ocultação, quando
esconde; e a integração, quando trás o dinheiro de volta à economia como se
fosse lícito. Mesmo assim, é importante ter em mente que a realização de apenas
um dos passos já é suficiente para ser considerado como lavagem de dinheiro.
Ela destacou que, atualmente,
operações aparentemente simples estão sendo consideradas como lavagem de
dinheiro pelo judiciário, e é justamente neste ponto que a classe extrajudicial
precisa ter atenção.
“Um exemplo, é que a partir de 2012 a sonegação de impostos passou a ser considerada lavagem de dinheiro, e isso vale para qualquer empresa que não emita nota fiscal. Então, qualquer pessoa que chegue no cartório com uma grande quantidade de dinheiro vivo é alguém que merece atenção”, explicou a especialista.
Ela enfatizou que operações de lavagem de dinheiro, no papel “são extremamente lícitas” e que a fraude é encontrada apenas quando se analisa profundamente as transações. Um exemplo disso são as empresas chamadas ‘noteiras’ que são utilizadas para o repasse de valores em esquemas fraudulentos. “Funciona mais ou menos assim, a empresa ‘x’ recebe um valor ilícito, em dinheiro e, por meio de um contrato de prestação de serviço falso, repassa esse valor para a empresa ‘y’ que, depois de receber, devolve o valor – parcial ou integralmente – para a empresa ‘x’”, exemplificou.
As obrigações que os titulares
terão de cumprir a partir de 3 de fevereiro, também foram discutidas na
formação. Entre elas estão a adoção de política de Prevenção a Lavagem de Dinheiro
(PLD), com processos de compliance; o cadastro de clientes e beneficiários
finais; o registro de operações; e as comunicações ao COAF.
“A implementação de um programa
sério de combate à lavagem de dinheiro não é barata. Os primeiros meses serão
difíceis, mas é melhor passar por isso do que, daqui alguns meses, estar sendo
citado em um processo de lavagem de dinheiro”, afirmou.
A advogada também explicou o
conceito e a origem da palavra compliance, que vem do termo em inglês ‘comply’
e significa fazer cumprir. Para Weyh, ter um programa de compliance eficiente é
o primeiro passo para atuar no combate à lavagem de dinheiro, mas é preciso
estar atento à programas de fachadas, que podem acarretar mais problemas no
futuro.
“O que precisa para ter um programa de compliance competente? É muito fácil, basta um programa que permita conhecer o cliente, saber se ele tem recurso para adquirir aquele bem, e se existe alguém atuando por meio dele – ou se aquela transação está mesmo sendo realizada por ele, sem interesses escusos. Outra coisa importante é o treinamento dos funcionários, estabelecimento de rotina e a criação de um manual de ações”, elucidou a palestrante.
Ela sugeriu a criação de um
cadastro chamado KYC – Know Your Client
(‘conheça seu cliente’ em português), em que antes de realizar qualquer ato, o
próprio cidadão preenche um formulário com suas informações.
Conforme explicou, é importante
que o meio e a forma de pagamento (por exemplo em transações imobiliárias),
devem ser sempre registrados. Caso o cidadão não queira informar, pode ser
registrado apenas que houve a recusa em indicar como e quando foi feito o
pagamento. Somente depois de finalizado o ato, o agente de cumprimento deve
informar ao COAF a transação, sem informar ao citado ou a qualquer outra
pessoa, sob pena de quebra de sigilo.
“Eu não posso aconselhar um
cliente a não fazer uma operação porque pode ser considerada lavagem de
dinheiro. O que se pode fazer é a solicitação de mais documentos, para que seja
possível entender a operação”.
Weyh explicou também a diferença
entre comunicações obrigatórias – que
preenchem critérios pré-estabelecidos pelo COAF –, e as suspeitas – que são as
que o agente de cumprimento desconfia que podem se tratar de lavagem de
dinheiro. Conforme a palestrante, os atos podem, inclusive, ser comunicados de
ambas as formas pois, caso se encaixe nos critérios obrigatórios, ainda é
necessário analisar se está adequada aos critérios subjetivos.
As comunicações devem ser feitas por
meio do SISCOAF,
pelo agente de cumprimento ou pelo titular do cartório, até o próximo dia útil
subsequente à realização do ato. Caso não haja comunicações de suspeita durante
seis meses, é necessário que seja realizado o reporte com a negativa de
suspeita de lavagem de dinheiro. “Se vocês perceberem que um ato não foi
comunicado no prazo, comuniquem quando vocês forem fazer a negativa”,
esclareceu.
Débora Weyh finalizou destacando que “o não reporte por si só não é crime, mas se eu ajudei o meu cliente a praticar dolosamente a lavagem de dinheiro, eu sou responsável também. E se eu não tiver um programa de compliance ou tiver um programa de fachada, eu já estou colaborando e, por isso, posso ser imputado criminalmente”.
Após o final da palestra, foi
aberta uma sessão para perguntas do público. O representante da SKY
Informática, empresa que presta serviço para grande parte dos cartórios
gaúchos, Fabrício Muller, comunicou que a equipe de Tecnologia da Informação
está trabalhando o mais rápido possível para desenvolver um programa que atenda
às exigências do Provimento Nº88/2019 do CNJ, mas que, infelizmente, não estará
pronto até 3 de fevereiro.
Fonte: Assessoria de Imprensa