Burocracia, preconceito, falta de
políticas públicas e de estrutura nos órgãos judiciais. Estes são os principais
fatores que dificultam a adoção no Brasil, de acordo com os especialistas no
tema que participaram, na tarde desta segunda-feira (7), da audiência pública
da Comissão de Cidadania e Direitos Humanos da Assembleia Legislativa para
tratar dos entraves legais que tornam demorados os processos de adoção no País.
O encontro foi proposto pela deputada Franciane Bayer (PSB), que quer buscar
alternativas para dar celeridade a estes trâmites sem, contudo, descuidar da
proteção às crianças e adolescentes. “Embora o número de pessoas dispostas a
adotar seja bem maior do que o de crianças e adolescentes disponíveis para
adoção, muitas delas (crianças e adolescentes) chegam aos 18 anos sem encontrar
uma família. Precisamos encontrar um caminho para dar celeridade a estes
processos”, defendeu.
No Cadastro Nacional de Adoção, há
mais de 46 mil pretendentes à adoção e pouco mais de 5.800 crianças e
adolescentes disponíveis. Um dos motivos pelos quais a fila não anda é que os
casais preferem crianças com até cinco anos, perfil que corresponde a apenas
20% dos cadastrados. A demora na destituição do pátrio poder é outro elemento
que faz com que os processos, muitas vezes, se arrastem.
A deputada federal Liziane Bayer
(PSB), irmã de Franciane, também vem trabalhando o tema em Brasília. Integrante
da Subcomissão de Debate sobre a Família e a Pedofilia na Câmara dos Deputados,
ela considera que é fundamental fortalecer a rede de proteção à infância e
adolescência para evitar que se chegue à situação de abandono, sensibilizar a
sociedade para a questão da adoção e dar prioridade às ações de adoção na
Justiça. “Precisamos dar celeridade sim, mas com o devido respeito à causa. Não
podemos esquecer que estamos tratando de vida e não de um produto, que passa de
mão em mão”, apontou.
Otimismo
A coordenadora da Vara da Criança e do
Adolescente do Tribunal de Justiça, juíza Nara Saraiva, afirmou que no Rio
Grande do Sul há 632 crianças e adolescentes disponíveis para adoção e 5.152
pretendentes. Como nos outros estados, a preferência é por crianças até seis
anos. Negros, pardos, indígenas, portadores de deficiência e crianças com
irmãos raramente são escolhidos.
Para reverter o quadro, o Tribunal de
Justiça, segundo ele, tem desenvolvidos algumas ações, como um aplicativo que
permite que os pretendentes visualizem as crianças, a promoção do Dia do
Encontro, que já está em sua terceira edição, e campanhas de incentivo à adoção
tardia.
Otimista em relação ao cenário gaúcho,
a representante do Ministério Público Cinara Braga considera que a situação
evoluiu desde que a Assembleia Legislativa aprovou em 2016 o relatório final da
Comissão Especial da Família, documento que identificou os principais
obstáculos à adoção no Rio Grande do Sul. “O quadro evoluiu e podemos dizer que
o Rio Grande hoje já é uma referência. O prazo das destituições diminuiu e as
habilitações acontecem em 120 dias. Antes, a espera para adotar um bebê era de
10 anos. Agora, é de 3 anos e meio”, comparou.
A estruturação das comarcas, segundo
ela, tem sido fundamental para acelerar os processos. “É preciso estruturar o
Poder Judiciário em todo o Estado. Cada comarca precisa ter, no mínimo,
assistente social e psicólogo para dar andamento aos casos”, defendeu.
Preocupado com os jovens que deixam os
abrigos aos 18 anos e não têm para onde ir, o secretário de Justiça, Cidadania
e Direitos Humanos, Catarina Paladini, sugeriu uma discussão ampla sobre o
tema. Uma das alternativas em debate é incentivar o ingresso deste público nas
Forças Armadas. Ele pediu o apoio da deputada Liziane Bayer para tratar o tema
em Brasília. Só em Porto Alegre, segundo ele, mais de 800 jovens abrigados
completarão a maioridade ainda neste ano.
Com o propósito de fortalecer os
vínculos familiares, a secretaria está elaborando o Plano Decenal de
Convivência Familiar e Comunitária, que irá à consulta pública em dezembro, e
lançará ainda em outubro o Plano de Enfrentamento à Violação Sexual de Crianças
e Adolescentes.
Devolução
Pai adotivo de uma adolescente, o
deputado Jeferson Fernandes (PT) chamou a atenção para um fenômeno que vem
crescendo: a devolução de crianças. Para ele, a prática é decorrente de uma
“visão romantizada da adoção”. “As pessoas procuram a criança perfeita, linda,
sem problemas e eternamente agradecida pelo nosso gesto. Só que ela não existe
e, como qualquer filho, tem qualidades, defeitos e conflitos”, ressaltou.
O parlamentar sugeriu a construção de
políticas pós-adoção e o fortalecimento dos grupos de adoção, como espaços de
preparação dos pretendentes e discussão de problemas.
A audiência pública contou com a
participação de profissionais que atuam no atendimento à criança e adolescentes
de vários municípios e do presidente do Instituto de Direito de Família,
Conrado da Rosa.
Fonte:
Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul