Preparar uma sucessão imobiliária de forma harmônica é
sempre um desafio, mas existem formas de se atingir esse objetivo. Dentre as
mais comuns, estão a doação em adiantamento de herança, a criação de uma
empresa e via testamento. Além dessas, novas possibilidades de acomodação e
partilha de bens imóveis foram trazidas com a Lei nº 13.777/18, que trata da
multipropriedade.
A multipropriedade é um “regime de condomínio” em que cada
um dos proprietários de um mesmo imóvel é titular de uma fração de tempo. É
preciso diferenciar essa modalidade do “time sharing”, pois ambas têm
distinções sob o ponto de vista legal. Por exemplo, os contratos de “uso
compartilhado”, popularizados nos anos 1980 aqui no Brasil, eram perpetuados
por redes hoteleiras, havendo a contratação da compra do uso de diárias em pool
de locação num sistema associativo. Estes contratos geraram um longo embate
jurídico quando surgiram penhoras e conflitos sucessórios.
A princípio, esses problemas estão resolvidos com a nova
legislação, porque agora a propriedade por tempo compartilhado possuirá uma
escritura pública e consequentemente matrícula imobiliária individualizada.
Portanto, como unidade autônoma com registro próprio, a quota da fração de
tempo apresenta-se livre para venda não
restando sequer o direito de preferência a condôminos. Os impostos e taxa de
condomínio são individualizados, bem como existe a possibilidade de que seja
oferecida em garantia hipotecária. A multipropriedade pode incidir também sobre
terrenos urbanos, rurais e imóveis comerciais, permitindo com isso inúmeras
composições e organizações comerciais e sucessórias.
Há também na lei a previsão que a multipropriedade possa ser
instituída em testamento, ou seja, como instrumento de composição patrimonial
sucessória. Como sabemos há casos em que um imóvel se destaca dos demais pelo
seu valor, importância ou significado familiar. Assim, um legado testamentário
estabelecendo tempo de uso pode ser muito útil em determinadas situações.
A nova lei precisa ser vista dentro de uma nova tendência de
compartilhamento de bens, que cresce exponencialmente, sobretudo entre os
jovens. Com a ideia de “propriedade” não significando a exclusividade plena do
bem, mas sim o momento de usufruir. Outros fatores como a diminuição dos
recursos naturais, a maior intensidade da vida urbana em grandes metrópoles e
seu consequente aumento de custo de vida caminham para essa racionalização no
uso dos imóveis.
Sem embargo, das susceptibilidades humanas, as vantagens do
compartilhamento condominial de imóveis têm-se apresentado maiores do que os
dissabores. O regime de propriedade
compartilhada pode não ser garantia de pacificação, mas é sem dúvida um
importante dispositivo que proporciona claras regras de uso, preservando um bom
arranjo entre pluralidade e exclusividade patrimonial.
Desta forma, a divisão por tempo de um imóvel, pode fazer
todo o sentido no planejamento de um patrimônio imobiliário, seja para uso ou
como fonte de renda.
*O autor é notário e presidente da Associação dos Notários e
Registradores do Estado do Paraná (Anoreg-PR).
Fonte: Bem Paraná