O Judiciário da
década de 40 não é o mesmo de hoje: avançou, inovou e se aproximou das demandas
da sociedade. É atenta a essas mudanças que a atual gestão da Corregedoria
Nacional de Justiça tem pautado sua atuação.
Em 8 de dezembro de
1945, foi criado o dia da Justiça. Desde então, essa data é um feriado, para
efeitos forenses, consagrado à Justiça. O Judiciário da década de 40 não é o
mesmo de hoje: avançou, inovou e se aproximou das demandas da sociedade. É
atenta a essas mudanças que a atual gestão da Corregedoria Nacional de Justiça
tem pautado sua atuação.
Em Portugal, na Idade
Média, julgar era mais uma das funções do rei. O soberano nomeava juízes,
inicialmente chamados de ouvidores, que o auxiliavam nessa tarefa. Com o tempo,
passaram a ser chamados de corregedores, com o papel de assessorar o rei na
administração da Justiça, fiscalizando as comarcas e organizando os julgamentos,
daí o nome "correger": reger com o rei, em conjunto com a Justiça.
Aos corregedores se apresentavam reclamações contra os demais juízes e
tabeliães. É dessa época, portanto, que veio a noção de que os corregedores
seriam os juízes dos juízes, já que, no âmbito ético e disciplinar, competia a
eles julgar os processos que envolviam os próprios juízes.
Espelhando-se no
modelo português, o Brasil Império passa a ter, em 1851, decreto que previa o
Regimento das Correições, detalhando calendário de visitas a comarcas, os
juízes que a elas se submetiam, as reclamações e as penalidades disciplinares.
Assim é que no Brasil, bem como em diversos países, a Corregedoria
tradicionalmente desempenha papel essencial para o Judiciário.
A Constituição brasileira
de 1988 engrandece o Poder Judiciário conferindo-lhe orçamento próprio,
autonomia administrativa e criando escolas da magistratura. Em 2004, a Emenda
Constitucional 45 cria o Conselho Nacional de Justiça, no qual se situa a
Corregedoria Nacional, que cuida do planejamento, da gestão financeira e
administrativa, da parte disciplinar e dos cartórios de notas e de registros.
Estão sob a fiscalização da Corregedoria Nacional 86 Tribunais, cerca de 17 mil
magistrados e aproximadamente 500 mil servidores, fora a parte extrajudicial
dos cartórios. Para compreender o papel da Corregedoria na gestão 2022-2024, é
preciso ter olhares em várias direções.
Em primeiro lugar, é preciso olhar para trás. A
fiscalização, exercida por meio da atividade disciplinar, correições e
inspeções, continua sendo a face mais conhecida da Corregedoria. O intuito da
atual gestão é verificar e reproduzir boas práticas e apurar adequadamente os
deslizes cometidos, com direito de defesa, mas sempre atuando fortemente para
evitar que ocorram.
Visitas vêm sendo
realizadas - por exemplo, nos Tribunais de Justiça de São Paulo, de Santa
Catarina e de Roraima, bem como no Tribunal Regional Federal da 2a Região -
para conhecer as boas práticas das Corregedorias locais. Em novembro
deste ano, iniciou-se projeto no Tribunal do Amazonas para replicar outro
bem-sucedido do Tribunal de Santa Catarina, que auxilia a inserção no mercado
de trabalho do jovem que vivia em casa de acolhimento, como lares de menores, e
dela precisou sair ao completar 18 anos, sem pai, mãe ou outra base familiar.
A Corregedoria
Nacional planeja também conhecer melhor o perfil dos magistrados por meio da
análise da investigação das causas dos procedimentos disciplinares, como a
morosidade ou ausência de juiz na Comarca. A partir deste diagnóstico, poderão
ser propostas soluções mais adequadas e aperfeiçoado o sistema judicial.
Existe ainda outra
face menos conhecida, mas não menos importante. A Segunda Guerra Mundial, da
pior maneira possível, deixou clara a importância da mudança do Judiciário para
que não mais fossem feitas atrocidades em nome da lei. Desde então, o sistema
judicial tem se mostrado imprescindível para a promoção da dignidade da pessoa
humana e para o desenvolvimento econômico. Visando alcançar esses intuitos, a
Corregedoria atua para aprimorar a gestão e elaborar políticas públicas a fim
de tornar mais eficiente a resposta do Judiciário ao cidadão.
Nesse ponto, entre as
15 diretrizes propostas pela atual gestão para os demais Tribunais, aprovadas
recentemente no Encontro Nacional do Poder Judiciário, uma destina-se à
fiscalização da aplicação dos precedentes obrigatórios, medida essencial para
trazer segurança jurídica e celeridade, e outra objetiva a promoção de práticas
e protocolos para o combate à litigância predatória. A fim de reunir as medidas
que vêm sendo adotadas pelos Tribunais e propor novas, a Corregedoria organizou
seminário no CNJ sobre demandas predatórias, realizado em 30 de novembro¹.
Em segundo lugar, é necessário olhar para o contexto
atual. A transformação digital no Judiciário trouxe um ponto que a Corregedoria
terá de enfrentar: o retorno ao trabalho presencial, tema que será objeto de
grupo de trabalho a ser criado pela Corregedoria, conforme decidido em
procedimento julgado pelo Plenário do CNJ².
Para além da
fiscalização, o contexto atual exige a automação e modernização dos cartórios
extrajudiciais, que hoje somam 13 mil unidades. O papel de impulsionar esse
setor é da Corregedoria, sobretudo com a edição da lei 14.382/22, que cria o
Sistema Eletrônico dos Registros Públicos, pavimentando o caminho para a
criação de cartórios digitais, uma das prioridades traçadas, objeto, aliás, do
primeiro seminário organizado pela Corregedoria³. Desse modo, incentivam-se
também as medidas de desjudicialização.
Ademais, a
Corregedoria espera lançar a Semana Nacional da Identificação Civil. Em um país
com grandes desigualdades sociais, a Corregedoria, com a colaboração dos
cartórios extrajudiciais, precisa estar atenta a políticas públicas de
identificação civil, com foco em questões relativas ao sub-registro civil,
população de rua, pessoas desaparecidas, população carcerária.
O mundo
interconectado e o crescente uso das redes sociais, somando-se ao cenário de
notória escalada da intolerância ideológica e de atos com motivação
político-partidária, impõem aos corregedores de todo o Brasil atuação firme
para a preservação da imparcialidade dos juízes, cabendo a estes, no âmbito
público ou privado, postura compatível com os deveres inerentes ao cargo. Esse
foi um dos motivos que ensejou a publicação do Provimento 135/22 pela
Corregedoria Nacional.
Em terceiro lugar, deve-se olhar para o futuro. Estamos
numa época extremamente relevante da nossa história republicana recente.
Passamos por uma pandemia, com todos seus desdobramentos sociais, econômicos e
políticos. Que Judiciário queremos daqui para a frente? "Paz, justiça e
instituições eficazes" é um dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável
da Agenda 2030 das Nações Unidas e tem o compromisso da Corregedoria para
buscar sua implantação.
Diversos temas estão
incluídos no nosso plano de gestão para o cumprimento do compromisso global. O
Instituto Nacional de Seguridade Social é o maior litigante brasileiro, tanto
na Justiça Federal quando na Justiça Estadual. Todos os dias, são ajuizadas 7
mil novas ações previdenciárias, a maioria sobre verbas alimentares. Além
disso, a execução fiscal - processo instaurado pelo Poder Público para o
pagamento de tributos - é responsável pelo maior volume de ações no país. Ambas
as matérias exigem inovações e, por isso, foi criado grupo de trabalho na
Corregedoria com a participação da Advocacia-Geral da União e do INSS.
Ainda em relação aos
direitos humanos, duas das 15 diretrizes propostas pela Corregedoria Nacional
para os demais Tribunais merecem destaque, concernentes tanto ao enfrentamento
à violência doméstica praticada contra magistradas e servidoras quanto à
acessibilidade e inclusão de pessoas com deficiência nos órgãos do Poder
Judiciário e de seus serviços auxiliares.
Todas essas direções apontam para um único objetivo: responder da melhor forma às pessoas que trazem seu problema para a Justiça. Essa é nossa missão e responsabilidade. E um compromisso a ser renovado a cada dia 8 de dezembro.
Autores:
Luis Felipe Salomão é ministro do STJ e Corregedor Nacional de
Justiça.
Caroline Somesom Tauk é juíza Federal do Tribunal Regional Federal da 2ª
Região e juíza Auxiliar da Corregedoria Nacional.
Daniel Vianna Vargas é juiz de Direito do Tribunal de Justiça do Rio de
Janeiro e juiz Auxiliar da Corregedoria Nacional.
Fonte: Migalhas