O Senado aprovou nesta quinta-feira (19) um projeto para
facilitar o acesso ao crédito, de forma a minimizar o impacto negativo da
pandemia de covid-19 na economia. O Projeto de Lei (PL) 4.528/2020, do senador
Paulo Rocha (PT-PA), dispensa a exigência de uma série de documentos fiscais na
hora da contratação ou renegociação de empréstimos, por empresas ou pessoas
físicas, junto aos bancos públicos. As medidas têm validade enquanto durar o
estado de calamidade pública.
O parecer aprovado também teve como base o PL 4.558/2020, de
autoria do líder do governo, senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), que foi
inspirado na Medida Provisória 958/2020, editada em abril, que perdeu a
validade em 24 de agosto sem ter sido votada no Congresso. O substitutivo
apresentado pelo relator, senador Plínio Valério (PSDB-AM), segue agora para a
Câmara dos Deputados.
Menos burocracia
As regras previstas estendem-se às operações feitas
diretamente pelos bancos públicos, ou por meio de subsidiárias e agentes
financeiros (instituições públicas e privadas que operam linhas de bancos
públicos).
Entre os documentos que deixam de ser exigidos estão as
certidões negativas de tributos federais e de inscrição em dívida ativa da
União, a certidão de quitação eleitoral, a comprovação do recolhimento do
Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural (ITR) e o Certificado de
Regularidade do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). Também fica
dispensada a consulta prévia ao Cadastro Informativo de Créditos não Quitados
do Setor Público Federal (Cadin).
Emendas
O relator, Plínio Valério, acolheu emenda apresentada ao
projeto, e fez uma mudança no texto original. Depois de uma discussão sobre
qual projeto levar em conta (leia mais abaixo), foram considerados prejudicados
o PL 4.558/2020 e o PL 4.553/2020, que tramitavam em conjunto e tratavam do
mesmo tema. O projeto de Paulo Rocha foi apresentado antes dos demais e teve
precedência para receber o parecer.
A emenda acolhida pelo relator foi apresentada pelo senador
Jaques Wagner (PT-BA) e veda o uso do crédito facilitado para fins de
distribuição de lucros e dividendos entre os sócios ou acionistas.
“Reconhecemos que se faz imperioso que a facilitação de
acesso ao crédito não seja utilizada no sentido de propiciar uso distinto
daquele que é o necessário nesse momento”, afirmou Plínio Valério em seu
relatório.
Por sua vez, emenda de redação apresentada por Plínio
Valério alterou a Lei 14.043, de 2020, para vedar às instituições
financeiras participantes do Programa Emergencial de Suporte a Empregos (Pese)
a cobrança de tarifas por saques, totais ou parciais, ou pela transferência a
outras contas, dos valores creditados nas contas dos agentes econômicos, mas
retirou do texto a vedação de cobrança de tarifas às movimentações desses
recursos nas contas de titularidade dos empregados.
Segundo o relator, "a vedação à cobrança de tarifas
estendida para além da empresa contratante, atingindo movimentações da conta do
empregado, atrelada à consequente obrigatoriedade de controle do cumprimento
dessa imposição, retira o interesse de instituições financeiras de participarem
do programa, o que terminará por prejudicar os trabalhadores, que terão
aumentado o risco de perder o emprego em meio à crise do coronavírus".
Seguro
Outra exigência suspensa pelo projeto é a contratação
prévia, prevista no Código Civil (Lei 10.406, de 2002), de seguro para os
veículos adquiridos por meio de penhor. As instituições financeiras também
ficam temporariamente autorizados a financiar, com recursos públicos, empresas
em débito com o FGTS.
Da mesma forma, empresas não precisarão apresentar a
Certidão Negativa de Débito (CND) na contratação de operações de crédito, na
contratação com o poder público e no recebimento de benefícios ou incentivo
fiscal ou creditício concedido por ele.
Para o crédito rural, o projeto suspende a obrigação do
registro da cédula em cartório de registro de imóveis se houver a vinculação de
novos bens a ela. Também deixa de ser necessário o seguro para os bens dados em
garantia em Cédula de Crédito Rural.
A proposta prevê, no entanto, que essas dispensas não se
aplicam às operações de crédito realizadas com recursos oriundos do FGTS.
Controle
Para garantir a fiscalização dos novos contratos, o projeto
determina ainda que todas as contratações e renegociações feitas com recursos
públicos terão de ser informadas trimestralmente à Receita Federal e à Procuradoria-Geral
da Fazenda Nacional (PGFN). Nos relatórios devem constar, no mínimo, os
beneficiários, os valores e os prazos envolvidos na contratação.
Ao justificar a proposta, Fernando Bezerra citou estudos do
Banco Mundial segundo os quais economias muito maiores que a economia
brasileira apresentam uma relação entre o crédito doméstico privado e o produto
interno bruto (PIB) significativamente superior. Em 2018, nos EUA, essa relação
era de 187%; no Japão, de 168%; na China, de 161%, enquanto no Brasil era de
61,8%. Para o senador, uma das razões para essa discrepância é a infinidade de
exigências impostas para concessão de crédito no país.
“Após quase seis meses desde o reconhecimento de calamidade
pública em decorrência do coronavírus, os impactos sociais e econômicos são
alarmantes. As medidas sanitárias trouxeram, e ainda trazem, impactos
imensuráveis, em razão da restrição ao funcionamento de empresas dos mais
variados ramos e pela redução da circulação de mercadorias e pessoas, restando
imprescindível a adoção de medidas voltadas à preservação das empresas”,
explicou o autor da proposta.
Precedência
Antes da votação do PL 4.558/2020, o senador Paulo Rocha
(PT-PA) lembrou que o PL 4.528/2020, de sua autoria, deveria ter precedência na
votação, por ter sido apresentado antes que o PL do senador Fernando Bezerra
Coelho, e o PL 4.553/2020, do senador Izalci Lucas (PSDB-DF).
— Ele precede, portanto, sobre os outros, que teriam que ser
apensados ao meu, não o contrário — defendeu Paulo Rocha.
Em resposta ao senador pelo PT do Pará, Fernando Bezerra
Coelho ressaltou que “não disputava a autoria, mas o mérito da proposta”.
— Se o texto de Paulo Rocha for idêntico ao meu, eu
claramente identifico que a autoria deve ser dada a Paulo Rocha. Mas, se o
texto for diferente, eu pediria a compreensão de Paulo Rocha, pois temos
trabalhado para que o texto por mim apresentado seja sancionado — afirmou o líder
do governo.
Plínio Valério, por sua vez, explicou aos senadores que os
projetos “são parecidos, não idênticos”.
— Fizemos uma emenda parecida com o que vimos nos projetos
de Paulo Rocha e Izalci Lucas. Estamos em uma Casa política, temos que ver qual
projeto vai ser mais palatável à aprovação, sem demérito dos outros dois
projetos — explicou.
Plínio Valério garantiu ainda que as reivindicações
defendidas por Paulo Rocha e Izalci Lucas em seus projetos estão contidas no PL
4.558/2020. E que a principal diferença entre este texto e os demais está na
extensão do prazo de suspensão em relação à exigência das certidões negativas.
— A gente aproveitou o que tem de bom nos projetos. A partir
da votação, o projeto é do Senado Federal — concluiu.
Como forma de evitar a votação de requerimento de
precedência, o senador Antônio Anastasia, que se encontrava na presidência dos
trabalhos, propôs a Plínio Valério que mantivesse o texto do relatório, mas na
qualidade de substitutivo ao projeto de autoria de Paulo Rocha. A sugestão foi
acolhida pelo relator, com a anuência dos demais senadores, o que tornou
possível a aprovação do texto.
Fonte: Senado